Especialistas dizem que a aquisição é um investimento interessante desde que a atual expectativa de valorização dos imóveis se confirme no longo prazo
EXAME. Eduardo Tavares
O ano de 2010 começa com grande expectativa com relação ao mercado imobiliário no Brasil. Graças à recuperação da economia e a programas de incentivo à compra de imóveis para a baixa renda, como o "Minha Casa, Minha Vida", o setor reaqueceu e terminou o ano passado como um dos mais movimentados da economia. A seu favor, há ainda a perspectiva de valorização de empreendimentos e terrenos graças aos impactos dos importantes eventos esportivos que o país vai sediar nos próximos anos.
Não há dúvida que esse seja um bom momento para pensar em comprar imóveis, seja para morar ou para obter algum lucro com a valorização. Entretanto, sempre que o assunto entra em pauta, traz consigo dúvidas sobre a melhor forma de investir. A resposta não é simples, já que envolvem diversas variáveis, algumas delas "intangíveis", como dizem alguns especialistas. Entretanto, mesmo que o problema não seja puramente numérico, é possível tomar uma boa decisão desde que se esteja disposto a correr atrás de informações.
Para Alexandre Melão, sócio da Drive Planejamento Imobiliário, quando se fala em comprar um apartamento ainda na planta, por exemplo, um bom trabalho de pesquisa pode significar lucro para o investidor. Logo de saída, ao entrar em um financiamento com essa característica, já se tem a perspectiva de uma valorização que vai de 20% a 30% entre o início das obras e a entrega do imóvel (em média, um período de 25 a 30 meses).
Comprar e alugar
Mesmo diante dessa valorização, caso o investidor tenha interesse em comprar um imóvel para alugá-lo, pode ser mais vantajoso optar por um já construído. O primeiro ponto a ser considerado ao entrar numa operação como essa é o que se paga pelo financiamento. Ademar Larini, presidente da Credipronto, uma joint venture entre a Lopes e o Itaú Unibanco, explica que, ao tomar uma decisão, é preciso comparar o aluguel com tudo o que está embutido em uma parcela de financiamento. "Há quatro componentes: a amortização do principal (a compra do imóvel propriamente), as despesas com juros, o seguro e as demais tarifas", diz.
Tomemos como exemplo a compra de um imóvel de 66 metros quadrados já pronto, na zona oeste de São Paulo, avaliado em 220.000 reais. Dando uma entrada de 30% (aproximadamente 60.000 reais) e financiando o restante em 30 anos, o comprador deve pagar uma taxa efetiva prefixada de 10,5% ao ano. O valor das parcelas deve ser de aproximadamente 1.750 reais: 1.255 reais de juros, 417 reais de amortização, 53 reais de seguros e 25 reais de outras taxas.
Agora suponhamos que, depois de iniciar o financiamento desse mesmo imóvel, o dono resolva alugá-lo. Segundo informações da imobiliária Lello Imóveis, especialista em aluguéis, é possível cobrar cerca de 21 reais por metro quadrado nessa região - ou 1.400 reais mensais. Esse valor, portanto, é suficiente para o proprietário pagar os juros para o banco, o seguro e as taxas mensais, que somam 1.333 reais, mas a maior parte do valor do principal de 417 reais terá de sair mesmo do bolso de seu bolso.
Logo, o comprador só terá vantagem com esse negócio caso a valorização do imóvel nos próximos anos seja superior à remuneração que ele teria investindo o dinheiro da entrada em um fundo de renda fixa, que apresenta baixo risco. Como esses fundos têm pagado uma remuneração líquida (já descontados os impostos e a taxa de administração) de cerca de 8% ao ano, o comprador ganharia 4.800 reais ao deixar aplicado os 60.000 reais que possui. Caso o imóvel de 220.000 reais tiver uma valorização superior a 2,2% ao ano, já será vantajoso deixar de ganhar 4.800 reais no fundo para comprá-lo.
Caso o comprador já possua os 220.000 reais no banco e não precise tomar o financiamento, a compra fica ainda mais vantajosa. Em um ano, o aluguel terá rendido 16.800 reais - contra 17.600 reais no fundo de renda fixa. Essa conta passa a ser favorável à compra com uma valorização anual de apenas 0,4% do imóvel escolhido.
Onde comprar
Para os especialistas, esse é um momento de expectativa de valorização dos imóveis, mas é necessário escolher bem a região onde será feito o investimento. Para Alexandre Melão, da Drive, como a cidade começa a se preparar para a Copa de 2014, sediada pelo Brasil, é hora de ficar atento às áreas da cidade que serão beneficiadas. O evento traz consigo a preocupação com uma série de melhorias na infraestrutura de transportes e no planejamento urbanístico. "Se tem, por exemplo, o anúncio de um projeto de expansão do metrô, a perspectiva de valorização dos imóveis nas imediações é de 10% a 20%", afirma. Quando a benfeitoria é entregue, esses números ficam ainda maiores.
Melão acredita especialmente em um movimento de valorização nas regiões oeste e sul da cidade de São Paulo, no eixo da "onda de melhorias" visando o evento esportivo. "Há muita possibilidade de crescimento no valor de imóveis entre as regiões do Jaguaré, Butantã e Morumbi, passando pela Vila Sônia", estima. Outras regiões que devem ser privilegiadas são a do eixo entre a rodovia Raposo Tavares e o município de Cotia, com a integração promovida pelo Rodoanel.
Todos esses bairros estão próximos do estádio do Morumbi, que, até o momento, permanece como o escolhido para abrigar os jogos da Copa na cidade. A região será beneficiada, entre outras obras, pela inauguração da linha amarela do metrô e de uma via paralela à avenida do Morumbi. As duas obras prometem reduzir os problemas de deslocamento na região.
Quais os riscos
Para Roseli Hernandes, gerente geral da Lello Imóveis, essa estratégia só é interessante porque o mercado está aquecido para a locação - o que diminui o risco de o imóvel ficar parado sem gerar a receita do aluguel. Entretanto, ela alerta que, antes de qualquer decisão, o investidor deve conhecer algumas das características do mercado de locação na região. "Se o valor do condomínio é alto, por exemplo, fica difícil alugar. Além disso, o tamanho do apartamento interfere. Geralmente os menores, como os de 65 metros quadrados, são os mais procurados", diz.
A gerente da Lello lembra ainda que, se o objetivo é investir, e não morar, pode ser mais vantajoso comprar um imóvel já construído. Embora o investidor perca o salto de valorização próprio das aquisições "na planta", essa operação permite um retorno imediato. "Há também o fato de que, com um imóvel usado, o comprador tem maior poder de barganha e dificilmente sofrerá com surpresas desagradáveis".
Outro ponto a favor da estratégia é a maior segurança trazida pelo locador com a nova lei do inquilinato, em vigor desde 25 de janeiro de 2010. Com as mudanças, o processo de retomada do apartamento no caso de um locatário inadimplente tornou-se um processo mais ágil. Além disso, o locador pode conseguir uma indenização se for o caso. Há, contudo, a possibilidade de que as novas condições impliquem em uma queda no valor da locação, devido à maior oferta. "Com essa nova realidade, mais de 2.000 imóveis em 'stand by' devem voltar ao mercado", diz Alexandre Melão, da Drive.
Os 7 distritos mais sustentáveis
Folha de São Paulo, Cristiane Capuchinho
Na compra de um imóvel, qualidade de vida é fator essencial na escolha. Mas, ao optar por um bairro, quais parâmetros definem esse conceito?
A Folha cruzou critérios para uma cidade sustentável - orientados pela Agenda 21, documento internacional sobre questões socioambientais - e uma pesquisa Datafolha, em que paulistanos deram notas para esses itens nos seus bairros.
Sete distritos de São Paulo se destacaram por estar acima da média em todos os quesitos. Entre os critérios - referendados por arquitetos ouvidos pela Folha - estão conservação de áreas verdes, transporte público e segurança.
Água Rasa e Mooca, na zona leste, Lapa, Perdizes e Vila Leopoldina, na oeste, e Santana e Tucuruvi, na norte, foram eleitos, superando distritos consagrados pelo mercado, como Alto de Pinheiros e Morumbi.
O ponto comum entre os sete distritos é o equilíbrio, destaca o arquiteto David Douek, da consultoria em sustentabilidade Otec. "Eles não têm grandes disparidades", afirma.
Exceto a Vila Leopoldina, nenhum dos distritos ultrapassa 1,36% dos domicílios em favelas, segundo a Sehab (Secretaria Municipal de Habitação); a média da cidade é de 12,67%.
A ausência de abismos sociais mostra áreas com melhor infraestrutura. Outros dois traços marcam esses distritos: diversidade social e a sensação de fazer parte da comunidade.
"É preciso olhar para regiões em que há convivência de vários tipos nas ruas", afirma o arquiteto Carlos Leite, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Distritos como Lapa, Mooca e Perdizes têm movimentos comunitários fortes que bancam reivindicações à prefeitura. "O morador contribui cuidando do espaço, varrendo sua calçada, apropriando-se da cidade. Em locais tradicionais, isso nunca se perdeu", diz Leite.
Valorização não costuma refletir sustentabilidade
"Para se pensar uma cidade sustentável, é imprescindível que se considere o crescimento dela", inicia o arquiteto David Douek. E falar da cidade é falar da reunião dos distritos - as unidades que dela fazem parte.
Foi pela necessidade de ajuste de cada uma dessas unidades para a melhora do todo que o governo francês criou um concurso de "ecobairros", para incentivar a adaptação da França a critérios de crescimento sustentável.
Entre esses critérios estão fornecimento de água, rede de esgoto, condições de moradia, conservação e limpeza de ruas, opções de transporte coletivo, áreas de lazer e para esportes, acessibilidade das vias para deficientes, coleta do lixo, qualidade do ar, conservação de áreas verdes e segurança.
Se parecem requisitos óbvios no momento da escolha de um imóvel para morar com qualidade de vida, também está claro que o crescimento de grandes cidades como São Paulo - e mesmo a valorização imobiliária de seus bairros - não se deu pautado por eles.
"Alguns parâmetros são básicos, como a quantidade de área verde por habitante. Há áreas de São Paulo com muito menos que os 12 m2 por habitante recomendados pela ONU (Organização das Nações Unidas)", cita o arquiteto Carlos Leite.
Mobilidade
"A circulação dos habitantes na cidade é um ponto essencial. À medida que há transporte público, as pessoas moram mais perto, gastam menos com locomoção e usam menos energia de origem fóssil [gasolina ou diesel]", pontua Douek.
"Em uma cidade sustentável, tudo chega de maneira mais barata e com uso de menos energia", diz o arquiteto e ambientalista Sérgio Prado. O morador tem em seu entorno tudo de que precisa no cotidiano.
A dificuldade de abrir mão do carro pela falta de metrô próximo, por exemplo, é o ponto que deixa uma região como Moema fora da lista de distritos paulistanos mais sustentáveis.
Apesar do problema com transporte, os lançamentos lá têm preço médio de R$ 5.957 o m2 - em Santana, por exemplo, ele vale R$ 3.787, segundo a consultoria Geoimóvel.
Imóveis próximos a áreas verdes e ao metrô já são normalmente mais valorizados.
Mas aspectos como acessibilidade das vias, áreas públicas de lazer e qualidade do ar, importantes para a integração e a diversidade dos moradores, nem sempre são pensados na precificação do metro quadrado e na hora da compra do bem.
O aumento de pessoas circulando a pé pelas ruas está ligado à sensação de segurança, fator de forte apelo em São Paulo. "A segurança impacta no uso de meios de transporte, no fato de ir a pé, na ampliação dos muros que criam sombra", exemplifica o arquiteto Douek.
Modelos
Quando esteve em São Paulo, em março, apresentando o projeto para uma cidade sustentável, Jean-Pierre Bardy, subdiretor do Ministério de Ecologia e Desenvolvimento Sustentável da França, afirmou: "A única maneira de pensar no futuro é ultrapassar as regras de hoje".
O discurso ecoa nas críticas a nosso modelo de mercado imobiliário. "Os bairros que mais se valorizaram estão saturados. São modelos excludentes, com muitas vagas na garagem, em condomínios fechados", afirma o arquiteto Leite.
Movimento busca índices de bem-estar
"Sobre a sustentabilidade, a grande questão é pensar em quais são os indicadores que devem ser olhados. Normalmente as avaliações são feitas a partir do PIB [Produto Interno Bruto], deixando o ambiente e a qualidade de vida de lado", afirma o empresário Oded Grajew, integrante do Movimento Nossa São Paulo.
Com o objetivo de delinear esses indicadores, a partir de amanhã o site da entidade (www.nossasaopaulo.org.br) trará um questionário para mapear quais são as prioridades dos paulistanos.
A pesquisa Irbem (Indicadores de Referência de Bem-Estar no Município) será feita com auxílio do Ibope e estará aberta à participação popular até o dia 30 de setembro. Os resultados devem apontar quais são os pontos a serem reivindicados às subprefeituras e à prefeitura.
Diferença
A percepção do morador sobre os problemas e as vantagens de seu bairro nem sempre é coerente com os dados objetivos apurados pela prefeitura.
Apesar da nota 6 dada na pesquisa Datafolha ao distrito da Mooca para o quesito da segurança -superior à média da cidade, de 4,6-, os números da Secretaria de Segurança Pública para a subprefeitura estão entre os piores da cidade no quesito crimes violentos não fatais. Enquanto a média da cidade é de 419,76 crimes a cada 100 mil habitantes, nessa região o índice é de 734 (números de 2006).
A variação entre opinião e fato tem relação com os parâmetros e as prioridades do morador de cada bairro. "A sensação do morador mostra a forma como ele irá agir na região e suas decisões em relação ao bairro", pondera o arquiteto David Douek.
"Conforme as pessoas refletem sobre sua qualidade de vida, passam a perceber o que é prioritário no bairro e de que forma podem contribuir", destaca Grajew.